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Mostrando postagens de dezembro, 2017

"o que há de RJ em mim?"

há em ti a rotina mais gostosa que eu já vivenciei. a cidade que amo de passagem, mas poderia morar sabendo que seria feliz - posso te amar de passagem, mas amo eternamente agora, sabendo que sou feliz - há em ti a mesma praça que eu não enjoo de ver todos os dias quando acordo e a mesma árvore na janela do apê alugado por uma semana que a cada entardecer me presenteia com uma folha nova há em ti o mesmo cheiro de bairro tranquilo localizado a doze minutos de distância do bairro da noite, das putas e dos boêmios há em ti a sensação gostosa de pisar na areia grossa em uma praia nublada na cidade maravilhosa e a promessa da visita de um lugar que acolhe e me refresca a memória revivendo a saudade do que não vivi há em ti um banho de mar desejado por cada átomo do meu corpo um banho que me refresca e que me faz gritar na beira da praia em despedida "obrigada, Existência! Eu volto, Ipanema, eu volto!"

entorpecer

a cabeça fria rege o corpo molhado que esquenta em euforia, agita o sangue sob a pele e desaba num sentir monstruoso desarmando o temor anulando o torpor instala-se, por escolha, o tudo poder sentir.

Sobre ser!

Já vou avisando que o "textinho" vai ser longo então se acomoda aí, pega umas almofadas, coloca Trem-bala pra repetir e me acompanha! Há um tempinho eu vi uma publicação que dizia "Somos tão passageiros que, não somos, estamos". Eu compartilhei meio assim... Não concordava totalmente, mas não sabia dizer de outro modo, então coube no momento. Depois de um tempo (bastante até, alguns meses), eu estava no grupo de estudos em fenomenologia (já falei um bocadinho disso por aqui, embora não explicitamente) num fatídico dia em que todo mundo faltou e ficamos só eu e o professor (sim!). Teve bastante assunto permeando a leitura e discussão. Dentre esses assuntos, eu trouxe a frase acima. - Professor, uma vez vi uma frase que dizia o seguinte "Somos tão passageiros que, não somos, estamos". Mas se a gente reparar, essa frase ainda segue a ideia que a fenomenologia se propõe a refutar, a de que o ser é estático, constante. - Sim!!! - e num lapso de...

Noturno

"a tua pele de Lua, o meu olhar de neblina." - Vitor Ramil eu sou um filtro azul de papel celofane cortado em formato retangular de tamanho igual às polegadas                                           [da tevê. giro num palco imundo rodeado do mais verde musgo que espalhava o fétido odor                                          [ao lugar. desgraçada coincidência fez jorrar água barrenta na terra que cheirava à morte. e ali em meio à vida, condenada a si: extinta. decretou-se: si, sedenta.

entardeceu

um ramo de flores laranjadas como o céu que acaba de pôr o Sol presas umas às outras com finos arames verde folha que simulam-lhe os caules frágeis. chama -de fogo e "vem"- e anuncia-se diante dos rostos chatos e dos calmos pés. repousavam sobre o barro seco, que solta-se fino ao passar dos dedos longos e fofos enfeitados com anéis.

Soul para o que jazz

Soul o Sol e também o concreto de cimento queimado encerado bem disposto ao lado do vermelho dos tijolos de barro. Soul a grama, que vive uma vida a cada nascer, morrer e reviver do Divino. Todas as manhãs Soul a fumaça, que ainda sai do cigarro há pouco afundado numa terra cor da Laura, de Clarice. Soul o som ao fundo sobreposto por figuras passinho. Soul o exercício do ócio, a representação do infinito contextualizado.

estrago

meu corpo pende eu sou um peso morto na balança viciada escorro como lama no capô do carro em dia de chuva forte quebra-se o fio da vida que estica até não poder mais o corpo que, sem medo se arrisca, mantendo a prudência retorna ao primo lugar um corpo que cai pelos ombros primeiro a cabeça alcançando a coluna de ferro e concreto e quebrando-lhe então o pescoço logo atrás caem as pernas e arrastam o tronco sobre si não se sabe como chega ao final do precipício e nem se tal final há.

vagalumes

a ponta do cigarro que acende às margens da rodovia são vagalumes anunciando fadas a tua voz fala aos meus ouvidos uma língua que eu não entendo reajo com passos que você não vê.

amnésia

esqueci de você me olhando com ternura sustentando aquele sorriso discreto no canto da boca esqueci do brilho nos teus olhos castanhos e pequenos quando alguém te perguntava sobre mim esqueci o som da tua voz quando insistias em perguntar no que eu estava pensando esqueci a nossa música e tudo o que você queria que eu lembrasse esqueci teu corpo nu ao lado do meu, repousando em lençóis bagunçados, na tua cama de casal esqueci a blusa que eu te dei, um presente que eu não terminei, algum dia entrego um outro, um que eu sinta que consegui acabar, como nós. De todas as coisas que eu esqueci, talvez a mais importante me permanece em memória esqueci de esquecer que ainda amo você.

pan-óptico

O gosto amargo perpassa a saliva secando na boca. A história escuta dizendo ao que salva: - Crucifico-te. Esmaga teu juízo vazio e denso de fumaça preta. A lixa de metal rasga a pele fina do teu braço. Aquele preço... As tuas unhas comidas por dentes fartos já gastos nos rojos lábios. Escreve, vadia! A tua imagem porca de gorda rosa com as entranhas de fora.

ansiedade

inflama tua carne vermelha e permite escorrer o sangue pelas unhas roídas cobertas por duras cutículas sangrando em teus dedos finos cujas extremidades frias combinam com as unhas roxas teus pelos sempre pretos pintam-se agora de vermelho num banho de sangue fresco.

na minha época

O teu ponto falado com orgulho risca as datas no calendário do primeiro ano da última década do século passado pendurado num prego enferrujado atrás da porta da cozinha que tu trancas à noite enquanto dormes.